quarta-feira, 6 de outubro de 2010

A Educação resolve tudo!

A Educação[1] resolve tudo!

Esta foi a afirmação de uma colega durante uma acalorada discussão que tivemos sobre os direitos sociais. O contexto foi esse: Esta colega me repassou um e-mail intitulado “kit do brasileiro”, o qual insinuava que o “excesso” de direitos sociais no Brasil só beneficiava vagabundo e quem paga os seus impostos não tem direito a nada, seguem alguns exemplos:

Tá desempregado?*
O governo dá Bolsa Desemprego

Teve filho?*
O governo dá o Bolsa Família..

Não tem terra?*
O governo dá o Bolsa Invasão e ainda te aposenta.


Imagine! Respondi o dito cujo “babando”, escrevi dentre outras coisas que devemos refletir a quem interessa o fim dos direitos sociais (muitos dos quais nem são exercidos integralmente), a resposta que recebi é o titulo deste texto.
Como o uso desta justificativa é recorrente e eu não concordo que o investimento em Educação isolado de outras seja suficiente para resolver a questão da desigualdade no Brasil, resolvi postar este texto com algumas reflexões acerca deste assunto.


É consensual a importância da Educação para  a construção de uma sociedade igualitária,democrática e sustentável.
A Educação é um direito social, previsto pela Constituição Federal Brasileira de 1988 no artigo 6º dentro do   Título sobre Direitos e Garantias Fundamentais :

 “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, a previdência social, a maternidade, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”

No Brasil a Lei de Diretrizes e Bases reafirma o direito á Educação e estabelece as diretrizes e bases do Sistema Educacional brasileiro.
Apesar de todas estas garantias a Educação no Brasil ainda não se constitui efetivamente como um direito social universalmente garantido.
O Sistema público de ensino não garante com quantidade e qualidade este direito,  Sergio Haddad[2] em artigo escrito para o Le Monde Diplomatique Brasil,diz que apesar de ter havido um aumento do número de matrículas na Educação Básica e um incremento dos anos obrigatórios de ensino, a universalização do atendimento escolar ainda não ocorreu e que segundo dados do MEC[3] de cem alunos que ingressam na Educação Básica somente 59 terminam a 8ª  série do Ensino fundamental e apenas 40 chegam ao final do Ensino Médio, este dado denota que aumentar o acesso  não garante a permanência dos alunos na Escola,o que provoca um exclusão educacional, não pela ausência de vagas, mas pela incapacidade de garantir condições para que estes alunos adquiram a  escolaridade.

A construção de um sistema  nacional de educação que atinja toda a população  brasileira com a mesma qualidade, respeitando as diversidades regionais e dos grupos sociais é uma das maiores demandas dos nossos dias.
A democracia educacional está condicionada a democracia social.
O que estou dizendo é que as condições de desigualdade se reproduzem na Educação e que esta por si só não é capaz de alterar estas condições e pode até reforçá-las no sentido que hoje é oferecida uma escola pobre para os pobres.
O combate as causas das condições que geram desigualdade deve caminhar junto com o investimento educacional.
 O padrão excludente de repartição da renda e da riqueza  não apresentou mudança substancial ao longo da História  do Brasil, em todas as fases (Colonia,Imperio e República), poucos  ficam com muito e muitos permanecem  com pouco, como afirma  [4]Marcio Pochmann :
“Os dados disponíveis e confiáveis indicam a persistência estrutural do jogo da distribuição pessoal da renda e da riqueza, mesmo quando ocorre o aparecimento de novos jogadores. Os 10% mais ricos da população impõem, historicamente, a ditadura da concentração, pois chegam a responder por quase 75% de toda riqueza nacional. Enquanto os 90% mais pobres ficam com apenas 25%.”

Daí a exclamação inicial vira indagação: A Educação resolve tudo? Entendo que sozinha não!
Nota:
Túnel do Tempo
Os sistemas públicos de Educação que tem como pressuposto o ensino universal, gratuito e obrigatório foram criados após as Revoluções burguesas (Revolução Industrial, Revolução Americana e Revolução Francesa), como forma de atender a necessidade por mão de obra mais qualificada e a reivindicação dos trabalhadores que queriam estudar, mas este Sistema não eliminou a dicotomia – escola boa, para ricos e escola precária para os pobres. Três séculos se passaram e as coisas não estão muito diferentes. Curioso né?!



[1] Educação Escolar
[2] Lê Monde Diplomatique Brasil –maio 2008 in Educação e Exclusão
[3] MEC INEP,Censo Escolar 2004

[4] Le Monde Diplomatique – outubro 2007 in O País dos Desiguais

Um comentário:

  1. Claudia, perfeito, e esta reflexão e consciência sobre as desigualdades sociais e fundamental para entender inlcusive a política de cotas e o conjunto de políticas chamadas ações afirmativas. De acordo com todas as suas argumentações fica evidente que é necessário tratar as populações históricamente vitimadas pelo racismo de maneira desigual e de modo a assegurar sua inserção e permanência em espaços de empoderamento, como é o caso das universidades, cargos públicos e partidos políticos, para citar alguns. Uma idéia amplamente discutida e aceita sobre isso é que políticas universalistas não resolvem o problema da desigualdade porque a inércia é muito grande a favor da condição desigual; tratar os desiguais de modo igual perpetua e aumenta a desigualdade, pela inércia engendrada que privilegia o opressor.
    Muito legal, obrigado Claudia!

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